InícioArtigosA Mesa da Palavra - Ascensão do Senhor - Ano B

A Mesa da Palavra – Ascensão do Senhor – Ano B

Autor

Data

Categoria

A MESA DA PALAVRA
Dom José Aparecido Gonçalves de Almeida
ASCENSÃO DO SENHOR
Missa do Dia
12 de maio de 2024
“Jesus (…) subiu hoje ante os anjos maravilhados ao mais alto dos céus” (Prefácio I)
Caríssimos amigos,
I. “Deus todo-poderoso, fazei-nos exultar de santa alegria e fervorosa ação de graças, pois na ascensão de Cristo vosso Filho, a nossa humanidade foi elevada junto a vós e, tendo ele nos precedido como nossa cabeça, nos chama para a glória como membros do seu corpo” (Coleta da Missa do Dia).
Com esta súplica inicial, repletos de alegria e gratidão, desejamos desde já repor no Senhor toda a certeza de que a nossa esperança cristã não é vã. Não importa o que aconteça, somos filhos de Deus, filhos muito amados. Por nós e para a nossa salvação, o Filho Unigênito foi enviado ao mundo pelo Pai. De fato, como nos diz o Apóstolo, “em todas estas coisas, somos mais que vencedores pela virtude daquele que nos amou. Pois estou persuadido de que nem a morte, nem a vida, nem os anjos, nem os principados, nem o presente, nem o futuro, nem as potestades, nem as alturas, nem os abismos, nem outra qualquer criatura nos poderá apartar do amor que Deus nos testemunha em Cristo Jesus, nosso Senhor” (Rm 8,36-39). A copiosa redenção alcançada pela Páscoa do Senhor nos dá esperança e, desde já, a posse antecipada dos bens futuros, como nos ensina a outra oração coleta sugerida para o dia de hoje: “Deus todo-poderoso, cremos que vosso Filho Unigênito, nosso Redentor, hoje subiu ao céu. Concedei também a nós habitar desde já nas moradas celestiais” (Segunda Coleta da Ascensçao, Missa do Dia).
As festas pascais volvem à sua conclusão e hoje celebramos a Ascensão do Senhor aos céus. Esta festa que, no calendário geral da Igreja Católica, se celebra na Quinta-feira da Sexta Semana da Páscoa, dez dias antes de Pentecostes, no Brasil fica transferida para o domingo seguinte, isto é, o sétimo da Páscoa.
Os dois prefácios da Ascensão do Senhor nos ajudam a aprofundar o mistério celebrado. Neles, o povo fiel bendiz a Deus pelo início da grande saga missionária da Igreja. Com efeito, o Senhor Jesus Cristo, antes de subir aos céus, envia a Igreja pelo mundo inteiro para anunciar o a Boa-Nova. A Igreja reunida em oração, ao realizar na Páscoa o memorial da Paixão, Morte e Ressurreição do Senhor, passou a celebrar “até que Ele venha” a vitória de Cristo sobre o pecado e a morte. Hoje, portanto, a Igreja celebra a sua Ascensão do Rei da Glória ao mais alto dos céus, ante os anjos maravilhados. Após a ressurreição, Ele aparece aos discípulos, envia-os em missão e, à vista deles, sobe aos céus. Sobe, não para afastar-se da nossa humildade, mas para dar-nos a certeza de que nos conduzirá à glória da imortalidade e nos tornará participantes da sua divindade.
Mediador eterno entre Deus nosso Pai e a humanidade redimida, Ele é juiz do mundo e senhor do universo, que antes da Ascensão promete enviar o Paráclito, Aquele que nos fará conhecer todas as coisas que o mesmo Jesus ensinou aos discípulos. E começa então o tempo comum da Igreja, não somente como tempo litúrgico, mas como tempo propício para converter todas as coisas, todas as circunstâncias da nossa vida corrente em ocasião de amar e servir a Deus, à Igreja, à humanidade inteira com o nosso ardor evangelizador.
A Coleta rezada no início desta Santa Missa é quase literalmente extraída de um sermão sobre a Ascensão (Sermo de Ascensione I 4, PL 54,396 b), pronunciado no século V pelo grande Papa e Doutor da Igreja, São Leão Magno. Nessa oração, a Igreja – com os sentimentos que animaram o zelo pastoral do grande Papa – pede a Deus que nos faça exultar de santa alegria e ardente ação de graças. Não se trata apenas de despedida, de olhar com tristeza para as nuvens do céu sem saber o que vai acontecer. A Nau de Pedro singra o mar da história entre tribulações e esperanças, certa de que somos destinados à vida sem ocaso. A esperança cristã não é uma vaga expectativa sem fundamento. É a certeza da fé que o Verbo de Deus, ao assumir pela união hipostática a nossa humanidade, tornou-se nossa cabeça e princípio. Ao subir aos céus, o Verbo de Deus humanado, leva as primícias da nossa humanidade ao trono do Altíssimo. “O Senhor Jesus Cristo não deixou o céu quando de lá desceu até nós; também não se afastou de nós quando subiu novamente ao céu” (S. Agostinho, Sermão da Ascensão). Assim, tendo nos precedido como nossa cabeça, ele hoje nos chama a tomar parte na glória como membros do seu corpo.
A esperança não decepciona, nos lembra o Santo Padre ao brindar a Igreja com a bula de convocação do Ano Santo de 2025. A nossa esperança tem fundamento na verdade da ascensão do Senhor. Por isso a Igreja nos faz suplicar a Deus que, mesmo por entre as tribulações do tempo presente, nós, membros de Cristo, exultemos de santa alegria e sejamos alegrados em nossa fervorosa ação de graças.
II. “Ide pelo mundo inteiro e anunciai o Evangelho a toda criatura!” (Mc 16,15)
Após a ressurreição, durante quarenta dias, o Ressuscitado apareceu aos seus discípulos em diversas ocasiões falando-lhes do Reino de Deus e dando aos Apóstolos que tinha escolhido “instruções pelo Espírito Santo”. Por fim, ao despedir-se, conferiu-lhes o mandato missionário: “Ide pelo mundo inteiro e anunciai o Evangelho a toda criatura!” (Mc 16,15). E conferiu credibilidade ao anúncio e autoridade aos anunciadores. A importância do anúncio missionário comporta o acesso à salvação e à vida eterna: “Quem crer e for batizado será salvo. Quem não crer será condenado!” (v. 16). Os vários sinais que Ele oferece ao apostolado conferem autoridade à ação dos Apóstolos, que mediante a Palavra exorcizam os maus espíritos, ficam imunes aos venenos da antiga serpente, curam as enfermidades que se opõem ao acolhimento da salvação eterna.
O mandato missionário não é algo opcional na vida cristã. Jesus usa dois verbos num solene imperativo: “Ide” e “anunciai”. É preciso ter disposição sair da nossa zona de conforto e, às vezes, da própria terra. Padre Antônio Vieira dizia no sermão da Sexagésima que o Senhor não só faz caso da semeadura como também do sair. Papa Francisco notabilizou a expressão “Igreja em saída”. Não pode ser apenas um lugar comum dos discursos eclesiásticos, mas uma atitude permanente de deslocar-se em direção aos outros com uma Palavra que salva. “Anunciai”: trata-se do querigma, da catequese, da pregação, sim. Mas, antes de mais, trata-se de fazer com que a Palavra impregne nossa vida e torne luminosa a nossa presença. O Evangelho, antes de ser discurso, é um Verbo vivo que configura nossa vida e torna atraente a mensagem à qual aderimos e o Senhor por quem fomos chamados e enviados. A evangelização tem como efeito aquele: “Seduziste-me, Senhor, e eu me deixei seduzir” (Jr 20,7).
E a atitude dos Apóstolos, no-lo relata São Marcos, foi de obediência generosa, serena e proativa: “Os discípulos então saíram e pregaram por toda parte” (Mc 16,20). E se verificam as promessas do Senhor: “O Senhor os ajudava e confirmava sua palavra por meio dos sinais que a acompanhavam” (id.).
A obediência é uma escuta amorosa e operativa do mandato do Senhor que, por graça do Espirito Santo, é assumido como vontade própria, internalizada no coração do discípulo que se deixou seduzir pela amizade do Senhor. Não sem razão o quarto evangelista nos dá aquele belíssimo diálogo de Pedro com o Ressuscitado, em que Jesus, ouvida a confissão do amor de Pedro, lhe diz: “Apascenta as minhas ovelhas” (Jo 21,17). Não são as nossas fragilidades o obstáculo à evangelização com Espirito, mas a falta de determinação em obedecer ao Senhor por amor.
III. “Não vos afasteis de Jerusalém, mas esperai a realização da promessa do Pai” (At 1,4)
A nossa fervorosa ação de graças acompanha o relato de São Lucas sobre a Ascensão do Senhor nos Atos dos Apóstolos, que acrescenta pormenores de grande importância ao relato de Marcos hoje proclamado. Em primeiro lugar, Jesus especifica que eles receberão o poder do Espirito Santo … para serem testemunhas até os confins da terra. Logo a seguir ele declara que “Jesus foi levado ao céu à vista deles”. O realismo do médico Lucas não deixa margem para dúvidas. Trata-se de um acontecimento que foi visto e pode ser testemunhado a outrem. Mas em seguida diz: “uma nuvem o encobriu” (At. 1,9). A nuvem evoca a nuvem que acompanhava o povo de Israel durante o Êxodo. Trata-se da Shekinah de Deus que envolve Jesus. Ele sai das vistas dos discípulos, envolvido pela glória de Deus. Sobe por entre aclamações e ao toque da trombeta – como sugere o salmo. Nossa humanidade assumida pelo Verbo é acolhida agora no céu por entre a exultação dos coros angélicos. Os olhos dos discípulos ficam fixos no céu. Os anjos os advertem a viver a esperança da vinda gloriosa, mas com os pés na missão.
Mas voltemos a um outro pormenor que retrata a conexão entre a Ascensão e a missão evangelizadora da Igreja. São Lucas, o Evangelista da misericórdia e dos pobres, dirige a um certo Teófilo a narração do início da maravilhosa saga evangelizadora da Igreja nascente. São as primícias do reino encarnado pela pregação do Evangelho.
É importante lembrar que Teófilo bem pode ser uma personalidade conhecida pelo evangelista. Mas também podemos considerar, pelo significado do nome, que nós mesmos somos os destinatários do anúncio. Teófilo significa “amigo de Deus”. Depois de ter escrito o evangelho de Jesus, agora dirige aos amigos de Deus o evangelho da Igreja, ou do Espirito que conduz a Igreja na história até que Cristo venha do mesmo modo como os apóstolos o viram partir para o céu envolto por uma nuvem, por entre aclamações.
Ele nos conta que, depois de ter dado instruções pelo Espírito Santo aos Apóstolos que ele mesmo tinha escolhido, Jesus foi levado para o céu. Aqui a Terceira Pessoa da Santíssima Trindade vai sendo evidenciada como ator, sujeito da evangelização e da expansão do Evangelho. O Reino de Deus se dilata na missão da Igreja.
Após a Ressurreição, durante quarenta dias, Jesus apareceu aos apóstolos, falando sobre o Reino de Deus. Ele pediu que permanecessem em Jerusalém para aguardar a realização da promessa do Pai: era a promessa de que todos seriam dentro de poucos dias batizados no Espirito Santo. Cumprindo-se esta promessa os discípulos iriam receber o poder do mesmo Espirito Santo, que se derramaria sobre eles, para serem testemunhas qualificadas em Jerusalém, em toda a Judeia e na Samaria, e até os confins da terra. O Batismo com o Espirito Santo conferia à Igreja nascente uma pujante empresa missionária, com respiro universal. O mesmo Espírito passará por aqui, também entre nós, para renovar a face da terra, dando-nos o dom de línguas para que o Evangelho, a Boa-Nova do Ressuscitado chegue com poder de transformação a todos os corações, a todas as realidades da terra.
O tempo dessa missão preconizada no Evangelho de Marcos e nos Atos dos Apóstolos deixados por Lucas aos amigos de Deus, a cada “Teófilo”, não se esgota na escuta dos contemporâneos dos Evangelistas. O autor principal é o Espirito Santo. São palavras de vida eterna que se estendem aos teófilos de todos os tempos até que o Senhor venha.
O envio do Espírito Santo prometido na Ascensão, cumpre-se em Pentecostes. Não se trata de uma efeméride, que se cumpriu no passado. O Espírito Santo é o hálito (Ruah) de Deus, é o Amor do Pai e do Filho, é como que a atmosfera em que a Igreja respira e ganha fôlego para permanecer atuante na história, não obstante os entraves a as tribulações.
IV. “Eu, prisioneiro no Senhor, vos exorto a caminhardes de acordo com a vocação que recebestes” (Ef. 4,1).
O mesmo Espirito Santo enviado à Igreja nascente para permanecer nela até à Parusia, inspira a organização da comunidade cristão dotando-a de  dons carismáticos ao lado dos dons hierárquicos. Todo o novo testamento testemunha como a comunidade nascente, fiel às moções do Espírito, guarda o depósito da fé e se organiza para que esta fidelidade permaneça no tempo. O Senhor prometeu que as portas do inferno não prevaleceriam sobre a Igreja. Ele mesmo a dotou do ministério apostólico dos Doze que a estruturam como novo Povo de Deus.
A unidade da fé, num só Senhor, a unidade no mesmo batismo é garantida porque “há um só Deus e Pai de todos, que reina sobre todos, age por meio de todos e permanece com todos” (Ef. 4,5-6). Esta unidade não sufoca a diversidade de dons e graças distribuídos profusamente na Igreja nascente e também hoje. “Cada um recebeu a graça na medida em que Cristo lha deu!” (v. 7).
A variedade dos ministérios eclesiais antes de distribuir poderes no seio da comunidade, capacita os seus “santos para o ministério, para edificar o corpo de Cristo, até que cheguemos todos juntos à unidade da fé e do conhecimento do Filho de Deus, ao estado do homem perfeito e à estatura de Cristo em sua plenitude” (vv. 12-13).
Caros amigos, gostaria de concluir esta nossa oração em voz alta, abrindo nossos ouvidos a uma voz que ressoa há séculos na Igreja: São Leão Magno. Neste texto que certamente inspirou a coleta desta missa, o grande Papa e Doutor da Igreja nos diz: “A Ascensão de Cristo é a nossa ascensão; já que o Corpo é convidado a elevar-se até à glória em que o precedeu a Cabeça, vamos cantar nossa alegria, expandir em ação de graças todo o nosso júbilo” (S. Leão Magno, cit.).
Exultemos, pois, de alegria e dilatemos o coração na ação de graças, abrindo nossas mãos pela fé operosa, pela caridade que nos faz cuidar dos irmãos que estão longe e dos que estão perto. Em tempos difíceis como os nossos, é preciso nutrir a esperança com a fé e o amor. A esperança não decepciona.
Diocese de Itumbiara
Diocese de Itumbiarahttps://diocesedeitumbiara.com.br/
A Diocese de Itumbiara foi criada no dia 11 de outubro de 1966, pelo Papa Paulo VI, desmembrada da Arquidiocese de Goiânia; seu território é de 21.208,9 km², população de 286.148 habitantes (IBGE 2010). A diocese conta 26 paróquias, com sede episcopal na cidade de Itumbiara-GO.

Últimas notícias