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A Mesa da Palavra – 27º Domingo do Tempo Comum – Ano B

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A MESA DA PALAVRA
Dom José Aparecido Gonçalves de Almeida
XXVI DOMINGO DO TEMPO COMUM – ANO B
Itumbiara, 6 de outubro de 2024
“Desde o começo da criação, Deus os fez homem e mulher” 

Diletos irmãos no Senhor,

I. “Ó Deus, (…) mostrais vosso poder sobretudo no perdão e na misericórdia” (Oração Coleta).

A oração da comunidade cristã não se dirige a um Deus anônimo e distante, dirige-se a um Deus que se revela Pai em Jesus, o Verbo humanado no ventre de Maria. Por esta razão é impregnada de filial confiança. A oração confiante obtém em primeiro lugar a misericórdia, mas também uma coroa de graças que vão muito além de qualquer pensamento e de todo desejo humanos.

Ouçamo-la de novo, inteira para saboreá-la como alimento espiritual. Trata-se de uma coleta já presente no sacramentário Gelasianum Vetus (redigido sob o pontificado de Gelasio I, entre 492 e 496), portanto, com mais de mil e quinhentos anos. Assim reza a Igreja hoje como outrora: “Ó Deus eterno e todo-poderoso, que nos concedeis, no vosso imenso amor de Pai, mais do que merecemos e pedimos, infundi em nós vossa misericórdia, para perdoar o que nos pesa na consciência e para nos dar mais do que a oração ousa pedir”.

Sim, irmãos, a coleta deste domingo é maravilhosa. Ela declara que Deus escuta as sentidas súplicas do Seu povo para além de tudo o que possamos desejar e merecer. E roga a Deus que derrame profusamente a sua misericórdia sobre nós para perdoar o que a consciência teme e oferecer em acréscimo o que a consciência não ousa esperar.
Esta oração é a oração da Igreja, obra de Deus enxertada em Cristo. Por isso devemos rezá-la com fé firme, com coração humilde e com o espírito pronto para o serviço a Deus e ao próximo. A oração da Igreja, feita por nós com estas disposições, é sempre prodigiosamente eficaz, produz milagres de conversão, de santidade e de apostolado.

II. “Por isso, o homem deixará seu pai e sua mãe e se unirá à sua mulher, e eles serão uma só carne” (Gn 2, 24)

A misericórdia de Deus é sempre derramada sobre o Seu povo em forma de aliança de amor, como vemos em toda a história da salvação. Já no Antigo Testamento a aliança entre Deus e o Seu povo muitas vezes se apresentou como uma aliança conjugal. São muitos os textos bíblicos que nos dão esta imagem quase sacramental do encontro libertador de Deus com a humanidade. Um encontro libertador em que Ele sempre procura resgatar os pequenos e fracos das escravidões, dos exílios, das prisões e das mais variadas formas de opressão.

Já no início da criação, antes do pecado original, na origem da família, da vida esponsal do homem e da mulher, está um maravilhoso desígnio de Deus que configura o amor conjugal como vocação. Une-os um vínculo profundo, uma igual dignidade, um reconhecimento recíproco. Formam “uma só carne”. Aqui está toda a beleza e a grandeza do Matrimônio: é uma comunhão íntima, fecunda, permanente, fruto do desígnio original de Deus, que não foi destruído pelo pecado.

“No matrimônio, Deus os une de maneira que, formando ‘uma só carne’ (Gn 2,24), possam transmitir a vida humana: ‘Sede fecundos, multiplicai-vos, enchei a terra’ (Gn 1,28). Ao transmitir a seus descendentes a vida humana, o homem e a mulher, como esposos e pais, cooperam de forma única na obra do Criador” (Catecismo n. 372).

Acolhendo a vocação ao Matrimônio, o homem e a mulher, para além de formar uma família na história, percorrem um itinerário que lhes franqueia a porta do céu. Nessa vocação se comprometem em ser sinal da fidelidade à Aliança de amor que Deus faz com o Seu povo. A fidelidade conjugal reflete a estabilidade da aliança entre o homem e a mulher que geram o edifício estável de uma nova família. A família gerada pela aliança do matrimônio é um sinal vivo da família de Deus na terra, formada a partir da Aliança do Senhor com a Igreja, aliança eterna a partir do selo da Cruz do Senhor.

III. “Portanto, que Deus uniu, o homem não separe” (Mc 10,9)

Como pudemos ver, a “Sagrada Escritura abre-se com a criação do homem e da mulher à imagem e semelhança de Deus (Gn 1,26-27) e se fecha com a visão das “núpcias do Cordeiro” (Ap 19,7). De um extremo ao outro, a Escritura fala do casamento e do seu ‘mistério’, de sua instituição e do sentido que lhe foi dado por Deus, de sua origem e de seu fim (…) de suas dificuldades provenientes do pecado e de sua renovação ‘no Senhor’ (I Cor 7,39), na nova aliança de Cristo com a Igreja” (Catecismo 1602).

Por isso, toda a liturgia de hoje reflete a conexão entre a origem do primeiro casal humano e da família fundada na aliança conjugal. Neste Evangelho Jesus reevoca o valor do matrimônio colocando em luz a sua origem divina “desde o início da criação”, portanto, ainda precedente à ferida do pecado.

Como dizia pouco antes, no projeto original de Deus – que nem o pecado desfez – o matrimônio é uma aliança indissolúvel, ordenada à fecundidade responsável como participação da obra divina da criação e da redenção. O divórcio, portanto, não é fruto da liberdade humana. É antes consequência institucionalizada das feridas que o pecado provoca na liberdade humana, que é de per si capaz de vincular-se livremente com um “para sempre”. No Antigo Testamento – no-lo afirma o próprio Jesus – o divórcio é tolerado por causa da “dureza do vosso coração”. A dureza do coração consiste na dificuldade de ser fiel até o fim por mera obediência à Lei. Com a redenção operada por Jesus, esta dificuldade existente em relação à Lei fica superada pela graça, pela força que Deus nos dá para conseguirmos abraçar os compromissos árduos no caminho da Vida. A quem se põe à escuta da palavra de Cristo, o divórcio aparece claramente contrário ao plano divino original agora restaurado por Cristo.

Quem acolhe com confiança e sem reservas o Reino de Deus, este é como uma criança. A criança, quando apoiada e sustentada pelos pais, consegue obedecê-los para a sua própria alegria. Assim a fidelidade do casal e a docilidade da criança são características do autêntico discípulo de Cristo, que nos atrai a Si e nos abençoa e nos enriquece com Seus dons.

IV. “… nós O vemos coroado de glória e honra, por ter sofrido a morte” (Hb 2,10)

Jesus vive. Sim nós cantamos com fervor e confiança que Ele vive, que Ele reina, que Ele é Deus e Senhor. E com o autor da carta aos Hebreus, declaramos que “nós o vemos coroado de glória e de honra, por ter sofrido a morte” (Hb 2,9). Foi pela graça de Deus em favor de todos que Jesus se dignou passar pela Cruz e provou a morte. Assim se constituiu um profundo vínculo de solidariedade e comunhão entre Ele e nós. Conosco e por nós Jesus passou pelo sofrimento.

Pela comum natureza humana, Ele nos chama irmãos e não se envergonha de nós. A comunhão entre Salvador e salvos nos consente viver com grande confiança os tempos de provação e nos faz esperar, com aquela esperança que não decepciona, a nossa perfeita configuração a Cristo quando Ele nos levantar da terra na ressurreição final. Esta amizade, a que frequentemente se opõem os nossos pecados, podemos sempre renová-la com o auxílio da graça, especialmente da penitência, que nos restaura para a Aliança com o Senhor.

Esta amizade, uma vez restaurada e alimentada, revigora a experiência mística do chamado conúbio espiritual, da aliança renovada da alma com seu Senhor. Por isso vale a pena rezar pela restauração das famílias, mas também pelo constante aprofundamento desse matrimônio espiritual da alma com Deus.

Podemos concluir esta nossa breve reflexão com uma oração coleta própria da versão italiana do Missal Romano, redigida em clara referência ao Evangelho sobre o qual estamos meditando. “Ó Deus, vós criastes o homem e a mulher, para que os dois sejam uma só carne, princípio da harmonia livre e necessária que se realiza no amor: pela ação do vosso Santo Espírito, reconduzi os filhos de Adão à santidade das primeiras origens, e dai-lhes um coração fiel, para que nenhum poder humano ouse dividir o que vós mesmo quisestes unir” (Coleta do 27 Domingo do tempo comum, Ano B).

Unamos esta nossa oração à da nossa amorosa Mãe, a Virgem Santíssima do doce título Regina Familiae. Rainha da Família, rogai por nós.

 

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A Diocese de Itumbiara foi criada no dia 11 de outubro de 1966, pelo Papa Paulo VI, desmembrada da Arquidiocese de Goiânia; seu território é de 21.208,9 km², população de 286.148 habitantes (IBGE 2010). A diocese conta 26 paróquias, com sede episcopal na cidade de Itumbiara-GO.

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