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A Mesa da Palavra – 26º Domingo do Tempo Comum – Ano B

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A MESA DA PALAVRA
Dom José Aparecido Gonçalves de Almeida
XXVI DOMINGO DO TEMPO COMUM – ANO B
Itumbiara, 29 de setembro de 2024
“O Espírito sopra onde quer” 
Diletos irmãos no Senhor,

I. “Ó Deus, (…) mostrais vosso poder sobretudo no perdão e na misericórdia” (Oração Coleta).

Hoje a Igreja nos omite a celebração litúrgica dos Santos Arcanjos porque a Liturgia dominical tem precedência. Reunidos aqui nesta igreja, elevamos louvores ao Deus vivo e verdadeiro, glorificando o Pai por ter enviado o Filho Unigênito ao mundo para nossa salvação. O Filho, por obra do Espírito Santo, se encarnou no ventre puríssimo da Virgem Maria e viveu em tudo a condição humana menos o pecado. Os Arcanjos, neste dia do Senhor, alegram-se por participar do nosso louvor e honram conosco o nosso Divino Redentor.

A Oração Coleta deste domingo tem raízes nas fontes antigas, milenares; radica-se na mais lídima e profunda tradição litúrgica romana, especialmente no antigo sacramentário Gelasiano. Nela, a Igreja invoca a Deus, cujo poder se manifesta “sobretudo no perdão e na misericórdia”, rogando-lhe que conceda em profusão a sua graça, para que possamos ir ao encontro de suas promessas e nos tornemos participantes dos bens celestiais.
Confiados nessas promessas do Senhor e confortados pela graça desta oração, vamos abrir os nossos corações à mesa da Palavra e da Eucaristia, pregustando na liturgia os bens da vida que não se acaba.

Hoje a Igreja no Brasil encerra o mês da Bíblia, mas mantém vivo o ardente apelo a que todos os católicos mergulhem nas profundezas da Palavra de Deus, consignada nas Escrituras inspiradas, tal como a nossa Mãe Igreja nos oferece em todas as expressões de sua vida pastoral.

A Palavra de Deus, hoje proclamada, nos convoca a uma reflexão mais profunda sobre a nossa vida de comunhão como membros do povo do Senhor. Ela nos convida a examinar, diante do espelho das Escrituras, a forma como acolhemos os irmãos e como nos abrimos à misteriosa presença de Deus em nossas vidas. As leituras de hoje nos ajudam a compreender melhor a urgência de partilhar a experiência da unção do Espírito, que todos recebemos nos sacramentos do Batismo e da Confirmação. Também nos coloca diante dos olhos a responsabilidade por nossa vida cristã e a indeclinável exigência de uma vida moralmente íntegra.

II. “Quem me dera que todo o povo do Senhor fosse profeta!” (Nm 11,29)

Esta passagem do livro de Números (Nm 11, 25-29) oferecido na liturgia dominical nos ajuda a compreender o Evangelho proclamado, deixando-nos entrever uma semelhança entre a atitude de Josué e a do Apóstolo João. Nela ficam evidenciadas a magnanimidade e a prudência presentes no modo de Moisés governar o povo confiado aos seus cuidados de pastor. Ele pede a Deus – e Deus lho concede – que torne os 70 anciães participantes da graça profética que ele exercia sozinho até aqui. Assim, para usar a forma simbólica da Escritura, “Deus tomou uma parte do Espírito de Moisés” e o derramou sobre os setenta anciães de Israel. Eles receberam o dom de profetizar, um sinal da presença divina que os capacitava para guiar o povo.

Entrementes, observamos um fato curioso: Josué, com excessivo zelo pela honra de Moisés, questiona a atitude de Eldade e Medade, que profetizavam no acampamento sem estar sob a dependência do velho líder. Era sincera a preocupação de Josué, não queria que nada diminuísse a autoridade do líder inconteste do Povo eleito.

Diferentemente de Josué, Moisés, porém, alegra-se ao contemplar a ação do Senhor, e a vantagem que dela decorre para o povo de Deus, sem se preocupar com eventuais detrimentos à sua proeminência pessoal. E a resposta de Moisés é pronta e muito eloquente: “Quem me dera que todo o povo do Senhor fosse profeta!”. Ele tem o coração livre de todo ciúme e resiste à tentação de manter uma liderança centralizada no seu protagonismo pessoal.

Chamados a trabalhar com humildade e dedicação na Vinha do Senhor, é importante que reconheçamos e abracemos os dons derramados em profusão pelo Espírito Santo, que, pelo Batismo, faz do novo Israel um povo verdadeiramente sacerdotal, profético e real.

III. “Quem não é contra nós, é por nós” (Mc 9,40)

Este tema da primeira leitura, é fácil notar, se entrelaça com a passagem do Evangelho de Marcos, que ilumina o nosso encontro com o Senhor nesta liturgia (Mc 9, 38-43. 45. 47-48). Neste episódio narrado por Marcos onde encontramos os discípulos de Jesus preocupados com quem realizava milagres em Seu nome, mas que não fazia parte do grupo imediato de seguidores.

Nesta segunda parte do Evangelho de Marcos, Jesus vai pacientemente corrigindo o espírito de seus discípulos mais próximos, homens generosos, sinceros, mas ainda rudes. Agora é a vez de São João, que mostra uma estreiteza de espírito semelhante à de Josué. Ciumento das prerrogativas do Mestre e dos seus seguidores mais próximos, não pensou no bem dos que eram libertos, mas na reserva de autoridade para expulsar demônios, que ele considerava ser exclusiva do círculo mais estreito dos discípulos.

A resposta de Jesus não se tarda. Ele adverte João, o discípulo amado, acerca desse zelo incompatível com o espírito cristão. O Senhor ensina que “quem não é contra nós, é por nós”. O Seu ensinamento quer vincar em nossas almas um princípio incancelável: o bem não deixa de ser bem, ainda que não seja eu, mas outro a realizá-lo. Na nossa convivência civil, devemos aprender a cooperar, também com pessoas de outras convicções, em vista do bem que se quer realizar. E antes de sermos críticos, é preciso louvar todo o bem que se faz.

Somos, então, chamados a uma atitude de abertura e gratidão a Deus pelo bem que Ele mesmo realiza em muitos lugares e através de muitas pessoas, mesmo aquelas que não compartilham da nossa fé.

Na sequência da perícope evangélica Jesus nos adverte sobre a imperiosa necessidade de evitar o escândalo dos pequeninos e de guardar os sentidos interiores e exteriores se quisermos permanecer no caminho da vida bem-aventurada. Jesus lança palavras duras de advertência: “Se alguém escandalizar um destes pequeninos… melhor lhe fora que uma grande pedra de moinho fosse colocada ao seu pescoço e fosse lançado ao mar” (Mc 9,42).

Aqui, ressoa a urgência e a gravidade com que devemos tratar o cuidado com os pequenos e os humildes na fé. A Igreja nos convoca a cuidar das crianças e adolescentes, bem como dos adultos que versam em condição de vulnerabilidade. Mais do que nunca a Igreja nos chama a desenvolver a cultura do cuidado, de sorte que nossos ambientes pastorais sejam realmente ambientes seguros para todas as pessoas, especialmente as mais frágeis.

IV. “… os brados dos ceifeiros chegaram aos ouvidos do Senhor do Universo” (Tg 5,4)

Na segunda leitura, da carta de Tiago (Tiago 5, 1-6), somos alertados sobre os perigos da riqueza e da opressão. Tiago denuncia os que acumulam bens e se esquecem da justiça e da solidariedade. Ele nos recorda que “os salários dos trabalhadores que ceifaram seus campos” clamam contra os ricos opressores. É um chamado à conversão das nossas práticas, estabelecendo valores de justiça e equidade no nosso dia a dia, porque, como nos lembra o Apóstolo, os brados dos ceifeiros sempre chegam aos ouvidos do Senhor do Universo.

A cupidez, também chamada avareza, consiste na insaciável avidez pelos bens temporais. A avareza frequentemente está associada à sensualidade e à sede de poder, que facilmente degeneram em opressão dos pequeninos, daqueles que dependem de nós. Ela representa, ademais, um grave perigo para a nossa alma, perigo contra o qual o próprio Senhor nos quis alertar: “Atenção! Tomai cuidado contra todo tipo de ganância, porque, mesmo que alguém tenha muitas coisas, a vida de um homem não consiste na abundância de bens” (Lc 12,15). Este alerta de Jesus a não colocar nossa confiança nas riquezas, mas sim em Deus, comporta também um convite a viver em solidariedade e amor com o nosso próximo. É preciso, pois, avaliar se estamos acumulando tesouros neste mundo à custa dos que pouco ou nada têm, em vez de buscarmos o Tesouro eterno que nos é prometido.

A grande liberalidade de Deus na distribuição dos dons (materiais e espirituais) não nos deve ofuscar a vista das coisas essenciais. Ele distribui dons e carismas, serviços e ministérios, nos convida a estar atentos ao acolhimento dos outros daqueles que são diferentes de nós. A absoluta liberdade de Deus deve ser por nós amada, especialmente quando nos é árduo reconhecer a ação do Espírito Santo em outras pessoas e lugares. Ao mesmo tempo, somos desafiados a examinar nossa relação com os bens e as riquezas. Estamos, de fato, comprometidos com a justiça e a solidariedade? O Apóstolo nos põe em guarda contra aqueles pecados que bradam ao céu e clamam a ira de Deus, especialmente a justa mercê devida a quem trabalha.

Os seguidores de Cristo somos chamados a examinar continuamente nossas vidas à luz do Evangelho e a fazer as mudanças necessárias para permanecermos fiéis à nossa vocação cristã. A disposição para estas mudanças nos colocará na presença do Deus cuja onipotência se manifesta sobretudo no perdão e na misericórdia.
Louvado seja nosso Senhor Jesus Cristo.

 

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