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Solenidade da Páscoa da Ressurreição do Senhor – II Domingo da Páscoa

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A MESA DA PALAVRA
Solenidade da Páscoa da Ressurreição do Senhor
II Domingo da Páscoa
Dominica in Albis seu De Divina Misericordia
Itumbiara, 27 de abril de 2025

“A quem perdoardes os pecados eles lhes serão perdoados” (Jo 20,29)

Caríssimos irmãos,

I. “Dai graças ao Senhor, porque ele é bom! Eterna é a sua misericórdia” (Sl 117,1)

O Mistério Pascal é tão central e significativo para a Igreja que continuamos a celebrar como se fora um só dia toda a oitava da Páscoa. Continuamos a celebrar o nosso louvor pela Páscoa da Ressurreição do Senhor que se prolonga da Vigília Pascal até hoje. O segundo Domingo da Páscoa é também chamado in albis porque nas priscas eras da Igreja os neófitos conservavam as alvas vestes do Batismo recebido na Vigília Pascal. No sábado da Oitava a depunham, mas a Igreja os exortava – como nos exorta hoje também a nós – a prolongar em suas almas a festa da Páscoa, permanecendo fiéis à graça com que foram enriquecidos, como nos sugere a belíssima e profunda coleta do Missale Gothicum (séc. VII/VIII) recolhida no nosso Missal Romano. A celebração pascal deve significar também para nós uma renovação da vida de batizados; e é por essa razão que a Igreja se dirige, instantemente, não só aos que acabam de ser acolhidos nela mediante o batismo, mas também a nós que há mais tempo fazemos parte da família católica.

Efetivamente, após quarenta dias de intensos exercícios de oração, penitência e obras de misericórdia, pede que os cinquenta dias entre o Domingo da Ressurreição e o Domingo de Pentecostes sejam celebrados com alegria e exultação, como se fossem um só dia de festa. “O Salmo [responsorial] começa e termina com as palavras dai graças ao Senhor porque Ele é bom, porque eterna é a sua misericórdia, por não haver nada mais agradável do que o louvor de Deus e o Aleluia eterno” (Santo Agostinho, Enarrationibus in Psalmus CXVII).
Outro motivo de louvor é que São João Paulo II houve por bem estabelecer que segundo Domingo da Páscoa fosse também denominado “Domingo da Divina Misericórdia”, quando da canonização de Santa Faustina Kowalska, a quem foi concedido conhecer e comunicar os segredos da confiança na misericórdia divina: “Jezu, ufam tobie! – Jesus, confio em ti!”. Na tão conhecida imagem de Jesus misericordioso, encontramos luzes para iluminar o nosso coração quando as trevas do pecado nos assustarem: Jesus, confio em ti!

Também o saudoso Papa Francisco, como verdadeiro apóstolo da misericórdia, ao longo de seu ministério petrino, afirmou reiteradamente que “Jesus Cristo é o rosto da misericórdia do Pai”. Ao dar este novo nome à festiva celebração, nada se alterou na eucologia (nas orações litúrgicas próprias) nem no lecionário. O Evangelho lido todos os anos nesta ocasião narra por assim dizer a instituição do sacramento da misericórdia e do perdão. Depois de ter sido traído e abandonado, Jesus Ressuscitado reencontra os seus discípulos, desejando-lhes a paz, transmitindo-lhes o dom do Espírito e a missão de perdoar. “Ao invés de cobrar explicações ou de condenar, Jesus lhes oferece a paz e propõe o perdão” (Card. Sergio da Rocha, Palavra do Pastor, 2020).

II. “Crescia sempre mais o número dos que aderiam ao Senhor pela fé” (At 5,14)

O Livro dos Atos dos Apóstolos apresenta a vida dos princípios da Igreja a partir da Ressurreição, sob o influxo do Espírito de Jesus, por meio da ação dos Apóstolos.

Na proclamação da primeira leitura, pudemos ver o efeito do anúncio fiel do Evangelho em Jerusalém. Depois da descida do Espírito Santo, os apóstolos, presididos por Pedro, vão tomando uma consciência cada vez mais clara de que, conduzidos pelo Espírito Santo, são testemunhas do Senhor Jesus e continuadores de sua missão. E assim será até ao fim: a força espiritual da Ressurreição de Jesus vai atingindo e transformando os homens, para os reunir na grande comunidade da Igreja de Cristo. Os sinais e prodígios da misericórdia do Senhor se derramam profusamente pela ação dos Apóstolos e se tornam a força atrativa de novos discípulos pela fé na Ressurreição. Na Igreja estes novos irmãos sabem que poderão encontrar a vida nova no Ressuscitado, que há de fazer de todos eles novas criaturas.

Hoje, também nós somos chamados a viver assim, para darmos a conhecer a todos a verdadeira Igreja de Cristo, aquela em que os sinais da primeira evangelização voltam a se apresentar por meio do nosso fiel acolhimento de Cristo Ressuscitado em nossas vidas. Vale a pena repercorrer os Evangelhos e os Atos para nos deixarmos atrair sempre de novo pelo viço da pregação apostólica.

III. “No dia do Senhor, fui arrebatado pelo Espírito e ouvi atrás de mim uma voz forte” (Ap 1,10)

Irmãos, é na força da Ressurreição do Senhor e na esperança da nossa futura ressurreição que se encontra o vigor do anúncio cristão e da vida dos discípulos nesta terra. Ainda que as circunstâncias insinuem o contrário, a esperança não decepciona. O ressuscitado está conosco. Assim aconteceu com João, discípulo amado, que recebeu a revelação da esperança, justamente no tempo de uma acérrima perseguição contra a Igreja.

O autor do Apocalipse, que já em tarda idade se encontrava preso na ilha de Patmos “por causa da Palavra de Deus e do testemunho de Jesus”, recebeu “no Dia do Senhor” (domingo) a revelação que devia comunicar às igrejas.

Por causa das perseguições ele emprega a linguagem apocalíptica para falar aos seus contemporâneos. Ele apresenta por meio de imagens complexas, mas cheias de beleza, o fim glorioso a que Deus conduz a Igreja por meio dessas mesmas tribulações que parecem destruí-la. É Jesus ressuscitado quem se apresenta a si mesmo, numa manifestação grandiosa, como vencedor da morte que vive para sempre.

Ele diz de Si: “Eu sou o Primeiro e o Último, aquele que vive. Estive morto, mas eis-me vivo pelos séculos dos séculos. Eu tenho as chaves da morte e do Hades [a morada dos mortos]” (Ap 1,17-18).

O Apocalipse descreve, enfim, a experiência mística de João durante a liturgia dominical.
Esta experiência do Apóstolo nos ajuda a ver como em cada domingo o Senhor ressuscitado continua a se fazer presente no meio de nós. A Liturgia aqui revelada, nos descortina como a Páscoa da semana ilumina a história e a vida da Igreja. A liturgia celebrada aqui é uma liturgia de esperança nos abre as portas para participar do banquete do cordeiro. Cordeiro. O que agora vivemos por meio dos sinais sacramentais, ser-nos-á dado in re na liturgia celeste.

IV. “No dia do Senhor… soprou sobre eles e disse: Recebei o Espírito Santo” (Jo 20,22)

Caros amigos, o Evangelho de hoje nos mostra duas realidades muito fortes: o Dom do poder de perdoar e a fé de Dídimo ou Tomé. Estas duas realidades apontam para a imensidão da misericórdia de Deus. Mas vejamos por partes, retomando o comentário sobre este Evangelho feito aqui mesmo nesta catedral no ano passado.

Detenhamo-nos na primeira parte do Evangelho proclamado. Deixemos que o Espírito Santo nos revele o Verbo. João narra que Jesus ressuscitado aparece aos Onze, mas lá estavam apenas dez. É quiçá o momento mais importante do Ressuscitado com seus Apóstolos. Eles estavam reunidos a portas fechadas por medo e temor. Jesus entra e os saúda dizendo: “A paz esteja convosco” ao mesmo tempo em que lhes mostrava as chagas que a glória da ressurreição não cancelou. Depois do quê lhes disse novamente: “A paz esteja convosco! Como o Pai me enviou, assim também eu vos envio a vós” (Jo 20, 21).
No Missal Romano, depois de uma longa lista de saudações, encontramos uma última bem simples, cujo uso cabe somente ao Bispo que preside a Eucaristia. A Igreja reserva aos Bispos a fórmula da saudação do Ressuscitado aos discípulos amedrontados, escondidos com as portas fechadas. Aos Apóstolos e a seus Sucessores cabe o anúncio da Paz, do gaudium cum pace, da Alegria com a Paz. A alegria e a paz, tanto as alcançamos quanto mais entregamos a nossa vida nas mãos do Senhor.

Justamente nesta saudação, anunciando que os enviaria em missão, Jesus sopra o Espírito Santo sobre os Apóstolos e lhes confere o poder de perdoar os pecados, o que é uma participação humana em um poder exclusivo de Deus. Como é consolador saber que a nossa fragilidade, após o batismo, não fica abandonada a si mesma. “Aqueles a quem perdoardes ser-lhes-ão perdoados os pecados. Aqueles a quem os retiverdes, ser-lhes-ão retidos”. Embaixadores de reconciliação, com uma unção espiritual que tem a força de Pentecostes, já no primeiro domingo da Ressurreição.

A missão da Igreja é anunciar a Paz. Cristo é nossa Paz. E só encontramos a Paz quando Cristo nossa Paz nos encontra na reconciliação, na misericórdia com que nos perdoa os pecados através dos sacramentos do perdão: primeiro o batismo, depois a reconciliação

V. “Meu Senhor e meu Deus” (Jo 20,28)

Mas a perícope evangélica nos apresenta também o domingo seguinte àquele em que o Ressuscitado conferiu aos Apóstolos o poder de perdoar os pecados. Trata-se da cena do encontro de Tomé com Jesus. Gosto de repetir insistentemente que nesta cena não vemos um apóstolo sem fé – como se costuma dizer. Aliás, vemos nesta cena o mais profundo ato de fé do Novo Testamento. Trata-se da profissão de fé de Tomé ou, como gostava de dizer o saudoso Papa Francisco, se trata da ressurreição de Tomé. Tomé queria ver as feridas do seu Mestre, para ter a certeza de que Jesus estava vivo. Falta de memória histórica. Não tinha ele visto o filho da viúva de Naim? Não tinha por acaso visto Lázaro que já exalava mau odor do tumulo? Quantas curas… e, no entanto, não conseguia admitir a possibilidade da Ressurreição. Pediu para ver os sinais da ferida e da morte para certificar-se de que estava vivo. Mas ao ver Jesus ele ressurge para a fé.

Quando, oito dias depois, o Senhor Jesus volta ao mesmo lugar e, estando as portas fechadas, põe-se no meio deles. A mesma saudação: “A paz esteja convosco”. Nós sabemos que Cristo é a nossa Paz. Estando Tomé entre eles, Jesus apresentou-se com a paz. Convida-o a tocar as suas feridas e o repreende, desejando que caísse em si: “E não sejas incréu, mas fiel” (Jo 20,27). Tomé, vendo ressuscitado o seu Mestre que cria ainda morto, agora se dobra e faz a mais bela e profunda profissão de fé do Novo Testamento: “Meu Senhor e meu Deus” (Jo 20,28).

Retomemos uma reflexão já feita ano passado a propósito de ver e crer. Visão e fé são coisas diferentes. Quem viu, tomou conhecimento, não necessita de um ato de fé, pois “a fé é fundamento daquilo que ainda se espera e prova de realidades que não se veem” (Hb 11,1). Quem vê apenas conhece, sabe, toma consciência. Mas o que aconteceu ali? De fato, Tomé viu o seu Mestre ressuscitado com as feridas da Paixão. Mas não é este o objeto da fé. Tomé viu o homem e acreditou em Deus. Viu o Homem Jesus e abraçou a fé em Jesus que é “meu Senhor e meu Deus”. Dá o salto de profundidade que lhe permite chegar depois à bem-aventurança. Esta profissão de fé, muitos a fazem ao verem a Santíssima Eucaristia elevada na consagração, gesto piedoso, embora não previsto na liturgia.

“Bem-aventurados os que creram sem terem visto” (Jo 20, 29), diz Jesus em seguida. O fato que Nosso Senhor tenha confirmado a sua mensagem de paz mostrando as feridas das mãos e 5 do lado aberto é muito significativo. Isso indica que embora o mistério pascal seja o mistério da Ressurreição, ele reevoca inexoravelmente a paixão e a morte. Então o anúncio da paz feito pelo Ressuscitado mostra que a paz é fruto do sangue de Cristo derramado na Cruz (cf. SC 33). No instante supremo (kairós) do Calvário Cristo transcendeu os limites do tempo, tomando sobre Si os pecados de todo o gênero humano e destruindo-lhes o poder com a força do seu sangue.

Bem-aventurados nós que ouvimos o testemunho sobre a Ressurreição de Jesus feito com poder e unção espiritual pelos Apóstolos. “Com grandes sinais de poder, os apóstolos davam testemunho da Ressurreição do Senhor Jesus” (At 4,33). O efeito fulgurante da Ressurreição sobre os fiéis fazia com que eles, embora incompreendidos e até perseguidos pelas autoridades, fossem “estimados por todos” (At 4,34).

Se a luz da ressurreição brilhar em nossas vidas, caros irmãos, nossa reputação humana também ganhará novas luzes e mesmo incompreendidos em muitas coisas, seremos estimados na comunidade em que vivemos pelas qualidades humanas que a graça de Deus exalta.

Queridos irmãos, repetita iuvant! É sempre conveniente repetir aquilo que se quer frisar. A profissão de fé de Tomé nos ajuda a compreender que ao ver o homem ressuscitado encontrou nele, pela fé, o Deus vivo e eterno, que reina para sempre.
Encontrar a Deus no ressuscitado, anunciá-lo e testemunhá-lo como São João, é fonte de alegria e paz. Alegria que “anunciamos” também à Virgem Maria.

Regina coeli, laetare, aleluia. Quia quem meruisti portare, Alleluia. Resurrexit, sicut dixit, Aleluia. Gaude et laetare, Virgo Maria, Alleluia. Quia surrexit Dominus vere, Alleluia.

 

 

 

 

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A Diocese de Itumbiara foi criada no dia 11 de outubro de 1966, pelo Papa Paulo VI, desmembrada da Arquidiocese de Goiânia; seu território é de 21.208,9 km², população de 286.148 habitantes (IBGE 2010). A diocese conta 26 paróquias, com sede episcopal na cidade de Itumbiara-GO.

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