O Papa a novos cardeais: sejam testemunhas da compaixão e da misericórdia

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“A disponibilidade de um Purpurado para dar o seu próprio sangue – significado na cor vermelha das suas vestes – é certa, quando está enraizada nesta consciência de ter recebido compaixão e na capacidade de ter compaixão. Caso contrário, não se pode ser leal.”, disse o Papa Francisco no Consistório, este sábado (05/10), no qual foram criados treze novos cardeais

“Estamos conscientes – a começar por nós – de que fomos objeto da compaixão de Deus? Dirijo-me em particular a vós, irmãos já Cardeais ou próximo a sê-lo: está viva em vós esta consciência? A consciência de ter sido e continuar sendo incessantemente precedidos e acompanhados pela sua misericórdia?”

Foram algumas das interpelações do Papa durante a homilia na tarde deste sábado (05/10), na Basílica de São Pedro, no Consistório no qual foram criados treze Cardeais. Em sua reflexão, partindo do trecho do Evangelho de São Marcos 6, 30-37a – pouco antes proclamado –, o Santo Padre se concentrou na “compaixão” de Jesus, centro da narração evangélica proposta, desenvolvendo-a posteriormente. “Compaixão, palavra-chave do Evangelho; está escrita no coração de Cristo, está sempre escrita no coração de Deus”, frisou.

A compaixão do Senhor encarnou a misericórdia de Deus
Francisco observou que nos Evangelhos, frequentemente, vemos Jesus “sentindo compaixão pelas pessoas que sofrem. E quanto mais lemos, mais contemplamos e mais entendemos que a compaixão do Senhor não é uma atitude ocasional e esporádica, mas é constante; mais, parece ser a atitude do seu coração, no qual encarnou a misericórdia de Deus”.

Referindo-se à cura de um leproso na Galileia em que, compadecido diante deste que se ajoelhara e suplicara que o curasse, Jesus estende-lhe a mão, toca-o e ordena que este fique purificado, o Pontífice acrescentou que neste gesto e nestas palavras, temos a missão de Jesus, Redentor do homem: “Redentor na compaixão. Ele encarna a vontade de Deus de purificar o ser humano doente da lepra do pecado; Ele é a ‘mão estendida de Deus’, que toca a nossa carne enferma e, fazendo-o, preenche o abismo da separação”.

“Esta compaixão não despontou a certo ponto da história da salvação. Não! Sempre existiu em Deus, gravada no seu coração de Pai. Vemo-lo na narração da vocação de Moisés, quando Deus lhe fala da sarça ardente dizendo: ‘Eu bem vi a opressão do meu povo que está no Egito, e ouvi o seu clamor, (…) conheço, na verdade, os seus sofrimentos’ (Ex 3, 7)”, continuou.

“Descartados institucionais” e estruturas de não-compaixão
“Muitas vezes, os discípulos de Jesus dão provas de não sentir compaixão, como neste caso da multidão faminta. Basicamente dizem: ‘Que se arranjem!’ É uma atitude comum entre nós, seres humanos, mesmo em pessoas religiosos ou até ligadas ao culto. A função que desempenhamos não basta para nos fazer compassivos, como demonstra o comportamento do sacerdote e do levita que, vendo um homem moribundo na beira da estrada, passaram ao largo (cf. Lc 10, 31-32). Terão dito para consigo: «Não é da minha competência». Há sempre justificações; às vezes até se tornam lei, dando origem a ‘descartados institucionais’, como no caso dos leprosos: ‘É certo que devem estar fora; é justo assim’. Deste comportamento muito humano, demasiado humano, derivam estruturas de não-compaixão.”

Temos consciência da compaixão de Deus por nós?
Após interpelar se estamos conscientes de que fomos objeto da compaixão de Deus, dirigindo-se em particular aos já Cardeais ou aos que logo em seguida receberiam o barrete cardinalício, Francisco afirmou que “esta consciência era o estado permanente do coração imaculado da Virgem Maria, que louva a Deus como seu ‘Salvador, porque pôs os olhos na humildade da sua serva’ (Lc 1, 48)”.“Em nós, está viva a consciência desta compaixão de Deus por nós? Não se trata duma coisa facultativa, nem – diria – dum ‘conselho evangélico’. Não! É um requisito essencial. Se não me sinto objeto da compaixão de Deus, não compreendo o seu amor. Não é uma realidade que se possa explicar. Ou a sinto, ou não. E, se não a sinto, como posso comunicá-la, testemunhá-la, dá-la? Concretamente: Tenho compaixão pelo irmão tal, pelo bispo tal, pelo padre tal? Ou sempre destruo com a minha atitude de condenação, de indiferença?”

“Desta consciência viva depende também a capacidade de ser leal no próprio ministério. Vale também para vós, irmãos Cardeais.”

“A disponibilidade de um Purpurado para dar o seu próprio sangue – significado na cor vermelha das suas vestes – é certa, quando está enraizada nesta consciência de ter recebido compaixão e na capacidade de ter compaixão. Caso contrário, não se pode ser leal. Muitos comportamentos desleais de homens de Igreja dependem da falta deste sentimento da compaixão recebida e do hábito de passar ao largo, do hábito da indiferença.”

Ser testemunhas d’Aquele que nos olhou com misericórdia
“Peçamos hoje, por intercessão do apóstolo Pedro, a graça dum coração compassivo, para ser testemunhas d’Aquele que nos olhou com misericórdia, escolheu, consagrou e enviou para levar a todos o seu Evangelho de salvação”, exortou por fim o Santo Padre.

Concluída a homilia, passou-se à criação propriamente dita dos novos Cardeais. Francisco elencou os nomes dos novos purpurados e anunciou a Ordem Presbiteral ou Diaconal à qual foram designados.

Seguiu-se o ritual, entre outros, com o ato solene de imposição do barrete, a entrega do anel cardinalício e a atribuição do Título ou da Diaconia aos novos purpurados entre os quais, Dom Miguel Ángel Ayuso Guixot, presidente do Pontifício Conselho para o Diálogo Inter-religioso; Dom José Tolentino Calaça de Mendonça, arquivista e bibliotecário de Santa Romana Igreja, e Dom Juan de la Caridad García Rodríguez, arcebispo de Havana, em Cuba.

Visita ao Papa emérito Bento XVI
Ao término do Consistório Ordinário Público o Pontífice visitou com os novos cardeais o Papa emérito Bento XVI, em sua residência Mater Ecclesiae, situada nos Jardins vaticanos.