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A Mesa da Palavra – Batismo do Senhor

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A MESA DA PALAVRA
Domingo do Batismo do Senhor
Itumbiara, 12 de janeiro de 2025

“Tu és meu Filho muito amado”

Caros amigos,
ao ser batizado por João Batista nas águas do Jordão, Jesus dá início à vida pública, com o anúncio do Reino e a pregação da conversão. Assim, nessa celebração litúrgica, se conclui o ciclo do Advento-Natal e se abre o Tempo comum. As festas do Mistério da Encarnação, especialmente neste Ano Jubilar, se prolongarão na cotidianidade do tempo comum. A vida cristã transcorre nas coisas mais corriqueiras da vida ordinária, enriquecidas pela presença de Deus na nossa história. Viver na presença de Deus nosso Pai na vida ordinária comporta dois aspectos: um aspecto interior ou contemplativo e outro mais exterior ou apostólico. Jesus, sem deixar a visão do Pai, anuncia o Reino e prega a conversão. De certo modo o Batismo de Jesus se apresenta como o Batismo do novo Povo de Deus.

I. “… concedei-nos que … sejamos interiormente renovados por ele, que é Deus” (Coleta, 2ª opção)
Neste domingo encerramos o tempo litúrgico do Natal, celebrando a Festa do Batismo do Senhor. Contudo, neste ano jubilar ordinário, nos tornamos peregrinos da Esperança comemorando de um lado os 2025 anos da encarnação do Verbo de Deus no ventre puríssimo de Maria “por nós homens e para a nossa salvação” (Símbolo Niceno-Constantinopolitano). Comemoramos também os 1700 anos do Concílio de Nicéia (maio-agosto de 325), que resolveu a controvérsia ariana ao declarar que Jesus, o Filho, é verdadeiro Deus, consubstancial com o Pai. Com isso reforçava a comunhão dos cristãos na mesma fé e explicava com maior clareza o ensinamento apostólico sobre a natureza divina do Verbo de Deus humanado. Jesus Cristo, sendo homem verdadeiro, é também consubstancial ao Pai: Deus de Deus, Deus verdadeiro de Deus verdadeiro.

Explicitando melhor o mistério da encarnação, o Concílio de Niceia (cerca de 320 Bispos reunidos) confirmou a verdade em que a cristandade unida, à exceção dos sequazes de Ário, sempre acreditara: Jesus Cristo é homem verdadeiro e consubstancial ao Pai.

Com a oração coleta desta Festa (a segunda opção), cujas raízes estão no antigo Sacramentário Gelasiano (n. 52) e na editio princeps do Missal Romano de 1474 (n. 221), a Igreja continua a meditar sobre o tema central da manifestação de Cristo na carne, bem característico das orações que celebram o mistério da Epifania e do Natal. Neste tempo forte, a liturgia da Igreja celebra com grande encanto e beleza o mistério da Encarnação e sua revelação ao mundo, tudo bem representado pela piedade popular nas imagens do presépio.

Na oração pedimos a Deus, cujo Filho encarnado reconhecemos como “exteriormente semelhante a nós”, que “sejamos interiormente renovados por ele”. Não é difícil identificar aqui uma referência ao mistério da Kenosis (ou esvaziamento) de Cristo, como descrito no capítulo 2 da epístola aos Filipenses: “Jesus se esvaziou (ἐκένωσε)” (2,7), Ele assumiu a forma de servo, tornando-se semelhante aos homens. Essa semelhança exterior é o meio pelo qual Ele se torna acessível a nós, permitindo que o humano encontre o divino.

E na súplica para sermos “interiormente renovados por ele” reconhecemos com a Igreja o efeito transformador da graça de Cristo na vida do cristão. Essa renovação interior ocorre especialmente no sacramento do Batismo, que nos regenera e nos configura a Cristo (cf. Tt 3,5; Rm 6,4).

II. “Eis o meu servo … pus o meu espírito sobre ele” (Is 42,1)
Isaías 41, 8-9 apresenta o povo de Israel, tomado em seu conjunto, como “servo de Javé”. Trata-se de um sujeito coletivo. Mas aqui na primeira leitura, a profecia que se cumpre no Evangelho, Isaías descreve as obras de um servo de Javé singular, aquele sobre o qual o Deus de Israel põe a Sua complacência: “Eis o meu servo – eu o recebo; eis o meu eleito – nele se compraz a minh’alma; pus meu espírito sobre ele; ele promoverá o julgamento das nações” (Is 42,1). Ele foi chamado para realizar a salvação que vem de Deus, isto é, a justiça. Ele cumpre a sua missão tornando-se aliança do povo e luz das nações, dando-lhes a luz e libertando-os do mal.

As citações feitas no Novo Testamento mostram que a Igreja nascente, iluminada pelo Espírito Santo, reconhecia nessa passagem o prenúncio da missão de Jesus: “Eu, o Senhor, te chamei para a justiça e te tomei pela mão; eu te formei e te constitui como o centro de aliança do povo, luz das nações, para abrires os olhos dos cegos, tirar os cativos da prisão, livrar do cárcere os que vivem nas trevas” (Is 42,6-7). Ele é o verdadeiro Servo sofredor, Ele é o Messias manso e silencioso (cf Is 42,2) que nos sustenta na esperança, que “não quebra a cana rachada nem apaga um pavio que ainda fumega” (42,3).

Ele anuncia a verdadeira libertação, que proclama o evangelho da Paz, da plenitude das bênçãos de Deus, por isso a assembleia solenemente reunida é chamada a tributar-lhe a glória e o poder, a adorá-lo com santo ornamento (cf. Sl 28, 1-2).

III. “Jesus de Nazaré foi ungido por Deus com o Espírito Santo e com poder” (At 10,37-38)
O trecho proclamado na segunda leitura constitui o início do discurso de Pedro proferido na casa do centurião Cornélio, a quem o Espírito o enviou. Ao iniciar, Pedro começa com uma constatação: “Deus não faz acepção de pessoas” (At 10,34), isto é, não prefere um povo a outro. Baseado nesta convicção de fé, Pedro passa a anunciar Jesus aos gentios.

O roteiro deste anúncio querigmático oferecido por Lucas tem a vantagem de delimitar no tempo os acontecimentos sobre os quais os apóstolos vão testemunhar: do Batismo no Jordão até à ascensão (10,36-42). Pedro, efetivamente, alude à profecia de Isaías para falar de Jesus, enquadrando num arco temporal a realização das promessas. “Vós sabeis o que aconteceu … depois do Batismo pregado por João: como Jesus de Nazaré foi ungido por Deus com o Espírito Santo e com poder” (At 10,37-38).

Depois, acrescenta que ele “andou por toda a parte, fazendo o bem e curando todos os que estavam dominados pelo demônio”, com o poder que tinha “porque Deus estava com ele” (At 10,38). Apresenta, ademais, sem reservas a catolicidade do anúncio da salvação, afirmando que Jesus Cristo é Senhor de todos, porque Deus não faz acepção de pessoas.

IV. “Tu és meu Filho bem-amado: em ti ponho o meu bem-querer” (Lc 3,22)
O Evangelho de Lucas se dirige aos amigos de Deus (ao caríssimo Teófilo) como ensinamento sólido. Lucas apresenta o Batismo no Jordão como início do cumprimento das profecias, vendo nisso a abertura de caminhos de vida nova. É o próprio João que testemunha o que viu no Batismo de Jesus. Jesus mesmo sabendo não ter necessidade alguma de um lavacro penitencial, se fez batizar pelo Batista. O Evangelista, porém, fixa a atenção sobretudo na manifestação por parte da Trindade, de que Jesus é o Filho, o Ungido.

No momento em que Jesus saiu da água, o céu se abriu e o Espírito veio sobre Ele em forma de pomba. E do Céu aberto a voz do Pai proclama: “Tu és meu o Filho amado, em ti ponho o meu bem-querer” (Lc 3,22). A concisão do texto de Lucas não lhe diminui a clareza. A Igreja nascente professa que Jesus é o Messias, o servo de Javé, cabeça do novo Israel. No Evangelho de Lucas, o centurião reconhece em Jesus um “Justo” (23,47), mas na narração paralela de Marcos, proclama que Jesus é realmente “o Filho de Deus” (Mc 15,39). Aqui se entende que só é possível reconhecê-lo como “o Filho de Deus” se aceitamos que Ele é o Justo crucificado no calvário.

A Igreja tem em Jesus, o Filho muito amado, a sua Cabeça. A missão para a qual foi ungida a Cabeça, se estende a todo o corpo. “É como o óleo precioso sobre a cabeça que desce pela barba de Aarão, até a orla do seu manto” (Sl 132). Os Padres da Igreja viram em Aarão a prefiguração de Jesus, Sumo e Eterno Sacerdote e, no corpo coberto pelo manto, a Igreja ornada com as vestes do Batismo. O Batismo da cabeça é efusão da graça redentora sobre todos os membros do Corpo do Senhor: “Desde o momento em que imergiu na água, o Salvador consagrou todas as fontes no mistério do Batismo, para que todo aquele que desejar ser batizado em nome do Senhor seja lavado não pela água do mundo, mas purificado pela água de Cristo” (São Máximo de Turim, Sermo 13 A, 3).

No nosso Batismo fomos configurados a Jesus Cristo Sacerdote, Profeta e Rei. Somos, portanto, participantes da missão messiânica de Jesus. Por esta mesma razão somos pregoeiros da esperança: passamos a vida fazendo o bem, curando os enfermos, saciando os famintos, abrindo os olhos aos cegos; nos tornamos irradiação de Cristo, luz das nações.

Caríssimos, neste Domingo do Batismo do Senhor, é preciso renovar a graça do nosso Batismo. Se tivermos fraquejado após o lavacro na piscina sagrada, aproximemo-nos do Deus compassivo com as lágrimas do arrependimento. Volvamos os olhos para a Cruz Jubilar, fixemos o olhar no Crucificado. Nele encontramos as entranhas de misericórdia. Dele somos filhos, filhos muito amados. E, com a Igreja orante, podemos suplicar a Deus o dom da fidelidade, rezando também a primeira opção da coleta da festa: “Deus eterno e todo-poderoso, que, tendo sido o Cristo batizado no rio Jordão, e descendo sobre ele o Espírito Santo, o declarastes solenemente vosso dileto Filho, concedei aos vossos filhos adotivos, renascidos da água e do Espírito Santo, perseverar constantemente em vosso amor”.

Louvado seja nosso Senhor Jesus Cristo!

Diocese de Itumbiara
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A Diocese de Itumbiara foi criada no dia 11 de outubro de 1966, pelo Papa Paulo VI, desmembrada da Arquidiocese de Goiânia; seu território é de 21.208,9 km², população de 286.148 habitantes (IBGE 2010). A diocese conta 26 paróquias, com sede episcopal na cidade de Itumbiara-GO.

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