A MESA DA PALAVRA
SOLENIDADE DA SANTA MÃE DE DEUS
Itumbiara, 1º de janeiro de 2025
“Salve, ó Santa Mãe de Deus” (Jo 14,1-7)
Caros amigos, irmãos peregrinos na esperança,
Estamos nos despendido do ano que finda com a ação de graças pelas maravilhas operadas por Deus em nós e suplicando o perdão de nossas faltas cometidas por fragilidade ou por malícia.
Peregrinos nesta esperança que não decepciona, imitamos o Apóstolo dos gentios que nos ensina a viver de esperança em esperança: “Irmãos, não penso que eu mesmo já o tenha alcançado, mas uma coisa faço: esquecendo-me das coisas que ficaram para trás e avançando para as que estão adiante, prossigo para o alvo, a fim de ganhar o prêmio do chamado celestial de Deus em Cristo Jesus”.
E não nos esquecemos de invocar a intercessão daquela que celebramos no início do novo ano como Santa Mãe de Deus. Ela é a Regina pacis, a Mãe do Príncipe da Paz. Ela é Mater Spei, a Mãe da Esperança, justamente porque em Jesus Cristo está toda a nossa esperança de salvação.
I. “… pela virgindade fecunda de Maria destes à humanidade o dom da salvação” (da coleta)
No Missal precedente à última reforma litúrgica, encontramos esta missa, da Oitava de Natal, com o título de Circuncisão do Senhor, como nos narra o Evangelho assumido no Missal atual. A oração coleta do atual missal é a mesma do antigo, e ao louvar a Deus pela virgindade fecunda da Virgem Maria, exalta a sua maternidade divina e a sua intercessão pela qual merecemos receber o autor da vida.
Podemos dizer que a obra da redenção começou pela Virgem Maria. Partem dela “as primícias do amor misericordioso”, os frutos do seu “sim” à Palavra do Senhor, a salvação trazida pela sua aceitação da condição de Mãe do Filho de Deus.
O nosso divino redentor, Jesus, passa antes de tudo através da fé de Maria, que acolhe o desígnio divino e esse manifesta totalmente disponível, como “serva do Senhor”, ao cumprimento de sua vontade. Maria concebe o Autor da vida por obra do Espírito Santo. O poder de Deus torna fecunda e deixa intacta a sua “glória virginal”. Jesus, com efeito, não nos é dado por merecimento nosso. Ele é puro dom do Espírito, ou seja, é dom da Graça.
A Virgem, “Mãe de Cristo e Mãe da Igreja”, hoje nos ensina a fé e o oferecimento de toda a vida ao desígnio do Pai. E o Pai tem para nós projetos de paz e de prosperidade, desígnios que garantem um futuro e uma esperança (cf Jr 29,11), que realizará também pela intercessão da Virgem Maria.
II. “O Senhor vos abençoe e vos guarde. Ele vos mostre a sua face e se compadeça de vós. Volva para vós o seu olhar e vos dê a Sua Paz” (Nm 6,24-26).
A fórmula de bênção reportada pelo livro dos Números, conhecida como bênção de Aarão ou também por Bênção de São Francisco, é uma das mais antigas que a Bíblia nos conservou. Ela consta de três petições que começam com o nome do Senhor. Alguns autores antigos viram nessa tríplice invocação um prenúncio da Santíssima Trindade. Em seguida se implora a proteção da vida, a graça e a paz; três dons que resumem as aspirações do homem e que só o bom Deus pode conceder em plenitude.
Esta bênção era empregada na liturgia do Templo e a Igreja, continuando a tradição de abençoar os fiéis nas suas celebrações litúrgicas, assumiu este venerável texto como primeira fórmula prevista para o final das missas do Tempo Comum.
Ao impetrar esta bênção, a Igreja não se move por uma ritualidade convencional. Ela nos confere, no início do novo ano, a graça de Deus para todos os dias do ano novo. E nós, com igual sinceridade, devemos fazer de nossa presença nos vários ambientes da nossa vida corrente uma manifestação de Deus, especialmente com as obras de misericórdia para com o próximo para quem desejamos um feliz ano novo. Pedimos neste ano jubilar a paz, a esperança e a alegria de nos reconhecermos verdadeiramente filhos de Deus.
III. “Quando se completou o tempo previsto, Deus enviou Seu Filho, nascido de uma mulher…” (Gl 4,4)
Ao entrarmos no novo ano, deixando as coisas que passam, podemos compreender o significado da expressão “plenitude do tempo”. Ela indica o encerramento da longa expectativa messiânica com o pleno cumprimento das profecias antigas. Tudo se realiza com o envio do Filho que assume a natureza humana no seio de uma mulher. Não se trata de uma casualidade. Desde antes da criação do mundo Deus escolheu a Virgem Maria por arcano desígnio de sua vontade, para nos dar o Verbo Eterno, agora revestido da nossa fragilidade. Assim, o Filho do Eterno Pai, fazendo-se Filho de Maria, insere-se na realidade histórica de um povo bem determinado, submetendo-se à Lei.
Ele vem para nos salvar. “Por nós homens e para a nossa salvação desceu dos céus e se encarnou pelo Espírito Santo no seio da Virgem Maria, e se fez homem” (Símbolo Niceno-Constantinopolitano). Ele nos resgata da escravidão da lei e nos torna filhos mediante a adoção filial, dada pelo Espírito Santo. Desde então, a pleno título, podemos nos dirigir ao Pai de Jesus, chamando-o Pai: Abá.
IV. “… deram-lhe o nome de Jesus, como fora chamado pelo anjo…” (Lc 2,21).
Caros amigos, a liturgia das primeiras Vésperas introduz-nos na festa de Maria, Mãe de Deus, Theotókos. A oito dias do nascimento de Jesus, celebramos Aquela que “quando chegou a plenitude do tempo” (Gl 4, 4) foi escolhida por Deus para ser a Mãe do Salvador. Mãe é quem dá a vida, mas também quem ajuda e ensina a viver. Maria é Mãe, Mãe de Jesus, a quem deu o seu sangue, o seu corpo. E é ela que nos apresenta o Verbo eterno do Pai, que veio habitar no meio de nós. Com são Gregório de Nazianzo (sec. IV) “nós proclamamos, em sentido absoluto, que a santa Virgem é própria e verdadeiramente Mãe de Deus”.
O Evangelho de hoje é o mesmo proclamado na missa de Natal, da aurora, mas com o acréscimo do versículo 21. A circuncisão era o rito mediante o qual se começava a fazer parte do povo eleito (cf Gn 17,2-27), recebendo um nome que exprimia a missão que o novo membro assumia na Aliança. Não sem razão o nome é dado pelo anjo no momento da anunciação. É Deus quem nos confere a vocação e a missão. Por isso a Igreja dá tanta importância à escolha dos nomes e convida os pais a evitarem nomes bizarros ou excêntricos e a estarmos atentos ao seu significado.
A maternidade divina de Maria se alarga da Cabeça a todo o Corpo. É Mãe de Cristo e mãe da Igreja. O quarto Evangelho e os Padres da Igreja nos fazem reconhecer em Maria a nova Eva, a Mãe da nova humanidade.
São Paulo VI, introduziu o Dia Mundial da Paz, precisamente no dia em que o Menino recebe o nome de Jesus: “Deus salva”. Ele é a nossa Paz. Há muitos motivos para rezar ao Principe da Paz pela Paz em nossos dias.
V. “Te Deum laudamos, te Dominum confitemur”.
Caríssimos irmãos,
hoje nós agradecemos a Deus pelo bem que tem feito à Igreja viva peregrina nas terras circunscritas pela Igreja de Itumbiara. Faço-me voz da nossa Igreja ao cantar o Te Deum cheio de gratidão e a todos convido a nos abrimos pelas mãos da Santa Mãe de Deus à esperança de um ano renovado na conversão e no júbilo pelo aniversário da Encarnação do Verbo e pelos 1700 do Concílio de Nicéia (325) que resolveu graves controvérsias cristológicas e trinitárias.
Podemos dizer que a Igreja vive para louvar e agradecer a Deus. Esta mesma “ação de graças”, ao longo dos séculos, é testemunha fiel de um amor que não morre, de um amor que envolve os homens de qualquer raça e cultura, disseminando de modo fecundo princípios de verdadeira vida.
Hoje, neste precioso anoitecer, ocaso do ano que passa, com as portas abertas para o novo ano de 2025, cantamos com fé o “Te Deum”. Enquanto elevamos a nossa ação de graças, quero lembrar de modo especial quem se encontra em dificuldade: as pessoas mais pobres e abandonadas, quantos perderam a esperança num fundado sentido da própria existência, ou são vítimas involuntárias de interesses egoístas, sem que se lhes peça a adesão ou opinião. Fazendo nossos os seus sofrimentos, confiemo-las a Deus, que sabe dirigir todas as coisas para o bem; a Ele entreguemos a nossa aspiração para que cada pessoa seja acolhida na própria dignidade de filho de Deus. Ao Senhor da vida peçamos para aliviar com a sua graça as penas provocadas pelo mal e para continuar a dar vigor à nossa existência terrena, doando-nos o Pão e o Vinho da salvação, para sustentar o nosso caminho rumo à pátria do Céu.
Ao nos despedirmos do ano que se encerra e nos encaminharmos para o novo, peçamos a Maria Santíssima que interceda por nós. A sua materna proteção nos acompanhe hoje e sempre, para que Cristo nos acolha um dia na sua glória, na assembleia dos Santos: Aeterna fac cum sanctis tuis in gloria numerari. Amém!